Sistema de Inovação x Ecossistema de Inovação: por que essa diferença muda tudo?
- Giovani Bernardo
- há 6 dias
- 4 min de leitura

Nos últimos anos, o Brasil aprendeu a falar sobre ecossistemas de inovação. Aprendeu a valorizar a aproximação entre governo, empresas, academia e comunidades; a importância de hubs, eventos, redes e espaços colaborativos; o papel dos ambientes de inovação como motores de cultura e desenvolvimento.
Esse movimento foi, e continua sendo, essencial. Mas ele não conta a história inteira.
Se quisermos realmente transformar territórios, precisamos ir um passo além: compreender que existem duas dimensões complementares, mas profundamente diferentes, que moldam o desempenho inovador de uma cidade, região ou país: o Ecossistema de Inovação e o Sistema de Inovação.
Ignorar essa diferença é um dos motivos pelos quais muitos territórios brasileiros começam bem… mas não conseguem sustentar seus resultados.
Este é o segundo artigo da série e, provavelmente, o mais importante para alinhar conceitos que influenciam diretamente políticas públicas, governança e a capacidade de inovação dos territórios.
O que é, afinal, um Ecossistema de Inovação?
Ecossistemas são organismos sociais vivos. São feitos de gente, cultura, redes, confiança, eventos, colaboração espontânea. Neles acontecem as coisas que costumamos celebrar:
startups nascendo,
universidades se abrindo para o mercado,
empresas se aproximando de hubs,
comunidades se articulando,
conexões surgindo naturalmente.
No ecossistema, a inovação acontece “por baixo”, de forma orgânica, viva, pulsante. Ele é dinâmico, imprevisível, fluido. O ecossistema é a vida que se manifesta num território. Mas… vida sem estrutura não se sustenta. E é aqui que entra a segunda dimensão.
O que é um Sistema de Inovação? E por que você quase nunca ouviu falar dele?
Muito antes da popularização dos ecossistemas, economistas como Lundvall e Nelson, assim como a OECD e a União Europeia, descreveram algo mais profundo: o Sistema de Inovação. Aqui estamos falando da arquitetura institucional que sustenta o desenvolvimento inovador:
políticas e leis,
instituições fortes,
fundos e mecanismos de fomento,
infraestrutura científica e tecnológica,
instrumentos formais de cooperação,
modelos de governança,
capacidades instaladas nas organizações.
No Brasil, isso aparece claramente na Estratégia Nacional de CT&I (ENCTI), que trata ciência, tecnologia e inovação como pilares estruturantes do desenvolvimento nacional. O Sistema de Inovação é a base que permite que o ecossistema exista.
Se o ecossistema é o movimento => o sistema é a estrutura.
Se o ecossistema é o comportamento das pessoas => o sistema é o conjunto de regras, incentivos e instituições que tornam esse comportamento possível.
Se o ecossistema é a “energia” => o sistema é a “rede elétrica”.

Por que confundimos as duas coisas no Brasil?
Porque o ecossistema é mais visível. Ele aparece no Instagram, nos eventos, nos hubs, nas conexões. Já o sistema é silencioso. Discreto. Ele acontece em documentos, arranjos, conselhos, regulações, fundos, diretrizes… e exige maturidade institucional.
Muitos territórios celebram o ecossistema e ignoram o sistema, e depois se perguntam:
“Por que não escalamos?”
“Por que perdemos continuidade quando muda o governo?”
“Por que dependemos de poucas pessoas?”
“Por que temos inovação, mas não desenvolvimento?”
A resposta é simples: Porque ecossistema sem sistema é fogueira sem madeira. Ela acende, mas não dura.
Onde está a diferença, de forma simples e prática
Ecossistema de Inovação | Sistema de Inovação |
Conexões, redes, cultura | Regras, políticas e instituições |
Colaboração espontânea | Cooperação estruturada |
Energia e velocidade | Estabilidade e continuidade |
Vida social da inovação | Arquitetura que sustenta a vida |
Eventos, hubs, comunidades | Leis, governança, infraestrutura, fomento |
Os dois são indispensáveis. Mas cumprem papéis diferentes. E nenhum substitui o outro.
O erro típico dos territórios brasileiros
Muitos municípios fazem exatamente isto:
✔ Criam um ecossistema inicial vibrante
✘ Sem construir o sistema que o sustenta
→ Resultado: discontinuidade a cada ciclo político
Ou:
✔ Criam estruturas formais e políticas públicas
✘ Sem vida no ecossistema
→ Resultado: papel, prédios e programas que não viram impacto
Essa desconexão é a raiz da maior parte das frustrações no campo da inovação territorial no Brasil.
A pergunta que deveria guiar líderes públicos e empresariais
Não é: “Como criamos um ecossistema?”
É: "Como alinhamos o Sistema de Inovação com o Ecossistema de Inovação para transformar potencial em desenvolvimento real?"
Quando isso acontece:
políticas se convertem em resultados,
hubs se conectam com instituições,
talento encontra oportunidade,
capital flui,
empresas inovam com mais velocidade,
a cidade se torna mais competitiva,
a economia se transforma.
A ponte entre os dois mundos e o que vem no Artigo 3
Entre o sistema e o ecossistema existe um elemento que costura tudo: a governança. Não a governança burocrática. Não o conselho “que se reúne de vez em quando”. Governança como capacidade coletiva de organizar, priorizar e sustentar processos. Governança como energia direcional. Governança como mecanismo de coordenação e continuidade.
É isso que vamos aprofundar no Artigo 3 da série, que será dedicado inteiramente a mostrar como a governança transforma:
intenção política → ação coordenada
estruturas formais → impacto real
ecossistemas vivos → territórios capazes de competir no longo prazo.
O Brasil já aprendeu a construir ecossistemas. O próximo passo, mais difícil, mas absolutamente necessário, é construir sistemas. Porque ecossistemas explicam o movimento. Mas sistemas explicam o desenvolvimento. E quando os dois se encontram, nasce aquilo que realmente importa: territórios capazes de inovar de forma contínua, consistente e com impacto real.




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